10 setembro 2017

Filipe Azevedo

Nesta reunião tinha estado presente o Eng. Filipe Azevedo, líder do consórcio Lucios-Somague, um dos grandes e mais dedicados mecenas do Joãozinho.

Tinha-o conhecido três dias depois de a Teixeira Duarte me ter pregado aquela partida de me exigir uma garantia de cinco milhões de euros a poucos dias do início da obra, e tinha sido ele, juntamente com o Eng. Vieira de Sá, que eu já conhecia, a salvar-me daquela situação difícil.

Nessa altura, veio ao meu escritório logo que regressou de França onde tinha ido acompanhar uma obra que a Lucios tinha lá a correr. Eu esperava um homem na casa dos 60 anos, talvez mal-encarado, que era a ideia que eu fazia do presidente de uma construtora, agora que já conhecia alguns.

Fiquei surpreendido quando, à porta do meu gabinete, recebi um homem ainda jovem, na casa dos quarenta anos, alto, encorpado, vestido de modo casual e sorridente, que vinha acompanhado de um colaborador.

Disse-me que sim a tudo o que lhe pedi. Como homem distintamente do norte, era um orgulho para ele fazer aquela obra, ainda por cima da maneira que eu lhe propunha, e tendo as crianças do S. João como destinatárias. Ele próprio era pai de três filhos ainda em idade pediátrica.

O Eng. Filipe Azevedo representava a terceira geração de uma empresa familiar que tinha sido fundada pelo seu avô e que tinha a sua sede mesmo ali perto do Porto, na Maia. O pai tinha-se retirado há poucos anos (e viria a falecer recentemente). A Lucios era uma empresa muito visível em obras do norte do país, embora não tivesse a dimensão da Somague, da Mota-Engil ou da Teixeira Duarte.

Foi um instante enquanto se estabeleceu uma grande empatia e uma grande relação de confiança entre nós e eu senti que o Eng. Filipe Azevedo gostava tanto daquela obra quanto eu. Meses mais tarde, um episódio seria revelador. Encontrei um colega de Faculdade que também o conhecia e que tinha estado recentemente com ele. Tinham falado sobre a obra do Joãozinho e o meu colega perguntou-lhe como é que se tinha envolvido nela. Ele terá respondido: "Eu, com o Pedro Arroja, vou a todo o lado". Esse sentimento era recíproco, observei ao meu colega.

À medida que nesse dia escutava o Dr. Oliveira e Silva, e ouvia o que ele tinha para me pedir,  vários sentimentos afluíram ao meu espírito, e um deles era o de vergonha,  o de um embaraço sem limites, perante o Eng. Filipe Azevedo, que estava sentado à minha esquerda.

Depois de todo aquele trabalho, depois de todo aquele dinheiro, depois de todos aqueles mecenas, depois de toda aquela intensidade emocional posta ao serviço do Joãozinho, depois de termos iniciado a obra vencidas que foram enormes dificuldades, depois de  vermos a obra parada há quase um ano porque o HSJ não cumpria aquilo que assinara - depois de tudo isto -, o que o Dr. Oliveira e Silva me estava a pedir é que a Associação Joãozinho, na sua qualidade de "Dono da Obra", desaparecesse dali para fora para nunca mais voltar. Quanto ao consórcio Lucios-Somague poderia sempre apresentar-se ao concurso público que o Governo iria lançar para fazer a obra.

O que é que o Eng. Filipe Azevedo estaria a pensar?

Provavelmente que "o lado" a que eu o tinha levado era, afinal, um grande fiasco para si, para a sua empresa e para todos aqueles que, como ele,  se tinham envolvido intensamente com o Projecto Joãozinho para o qual eu os arrastara.

O Dr. Oliveira e Silva é uma pessoa muito delicada. Por isso mesmo, estou certo que até hoje ainda  não se deu conta da violência que estava a cometer sobre mim nesse dia.

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