31 agosto 2008

É assim.


Argumentei neste post que o debate intelectual é um instrumento poderoso e eficaz da cultura protestante para resolver os problemas sociais, e até pessoais. Argumentei também que na cultura católica o debate intelectual é um instrumento totalmente ineficaz, e frequentemente risível, para o mesmo efeito.

Mas como resolve então a cultura católica, dentro da sua própria tradição, o problema de encontrar solução para os problemas sociais, e até pessoais? A resposta é a de que compete à autoridade encontrar a solução para cada problema e depois comunicá-la a todos os que dependem dela: "É assim. E não há mais conversa". Porque se a autoridade permite conversa, isto é, o debate, não só o debate não leva a lado nenhum, como os intervenientes vão perder o respeito pela autoridade. É o caos.

matanças


O ênfase que a cultura protestante pôe naquilo que é igual em todos os homens - a natureza humana -, ao contrário da cultura católica que tende a salientar aquilo que lhe é peculiar ou distintitivo não tem só inconvenientes para a cultura católica, como a sua relativa incapacidade em criar ciência, que salientei neste post.

É que as teorias sociais que são criações predominantemente protestantes são também a origem das ideologias que, no último século, contribuiram para matar milhões de pessoas. O nacional-socialismo e o comunismo, as duas ideologias mais mortíferas que a humanidade conheceu, não poderiam ser senão criações protestantes, ambas com origem alemã.

Não apenas uma ideologia como teoria e programa social pressupõe a démarche prévia de abstracção que consiste em reduzir todos os homens a uma condição de igualdade - a natureza humana -, como depois, quando se trata de matar em nome dela, torna a matança mais aceitável porque se trata então de matar pessoas que, sendo todas essencialmente iguais, são facilmente substituíveis ou replicáveis. Matam-se uns hoje, amanhã nascerão outros para os substituir.

Pelo contrário, os povos de cultura católica, não sendo capazes de desenvolver teorias sociais e ideologias, dada a alta personalização da sua cultura e a sua incapacidade de abstracção, nunca serão capazes de matar maciçamente em nome delas.

debates


A diferença entre a cultura protestante e a cultura católica para raciocinar em termos abstractos tem outras implicações para além da vantagem relativa que confere à primeira em relação à segunda para criar ciência, e que salientei no meu post anterior. Na realidade, essa diferença reflecte-se em muitas outras instância da vida social. Tratarei neste post de uma delas.

Refiro-me à qualidade do debate intelectual nas duas culturas. A cultura protestante enfatiza aquilo que é comum ao homem - a natureza humana. A cultura católica, pelo contrário, enfatiza aquilo que é peculiar ou distintivo em cada homem - a sua personalidade. Assim, num debate público sobre um tema social em país protestante todos os intervenientes assentam as suas intervenções nos mesmos pressupostos - a natureza humana. É o facto de os pressupostos serem comuns a todos os intervenientes que permite a formulação de teses que são confrontáveis entre si e de cujo confronto podem resultar compromissos e até consensos.

Pelo contrário, num país católico a concentração dos participantes é naquilo que é peculiar ou distintivo em cada homem. Não existem pressupostos comuns na discussão e quando assim é o debate intelectual é estéril e a obtenção de consensos, ou sequer de compromissos, torna-se uma miragem. Isso explica em parte porque em Portugal, como em outros países católicos, os debates públicos, seja televisão, nos jornais ou na blogosfera não conduzem a conclusão nenhuma e são uma pura perda de tempo, senão mesmo por vezes um espectáculo deprimente.

E isto é assim, não é de mais relembrar, porque a cultura protestante tende a concentrar-se naquilo que é essencial ou permanente nos fenómenos sob discussão, enquanto a cultura católica tende a dispersar-se naquilo que é acessório senão mesmo excepcional.

abstracção



Provavelmente uma das maiores diferenças entre os países de tradição Protestante e os países de tradição Católica é a qualidade da sua vida intelectual, a qual é consideravelmente mais interessante entre os primeiros. Nas ciências sociais, existe apenas uma ciência que é contemplada com o Prémio Nobel - a Economia. Não existe um único Prémio Nobel da Economia nos países católicos ao sul de França ou na América Latina. Pertencem todos ao norte da Europa e à América do Norte, que são países de tradição predominantemente protestante. O panorama não é sensivelmente diferente nas outras ciências.

Na minha opinião, a principal razão para esta diferença cultural reside na maior capacidade dos povos protestantes para raciocinarem em termos abstractos em comparação com os povos católicos. Sem abstracção não há teoria e não há ciência.

A capacidade de abstracção leva a deixar de lado aquilo que é peculiar ou efémero numa certa classe de fenómenos para isolar aquilo que é permanente e essencial. No caso das ciências sociais e humanas esta démarche leva à focalização na chamada natureza humana, aquilo que é permanente e comum a todos os homens. É a partir desta abstracção que é a natureza humana que se torna então possível generalizar e estabelecer leis sociais, como as leis da procura e da oferta na Economia, e construir uma ciência social.

A teologia católica desde há séculos que enfatiza que o Deus católico é um Deus pessoal no sentido em que Ele cuida de cada um dos seus filhos individualmente. Pelo contrário, a teologia protestante tende a ver Deus como um Deus que, sendo de todos os homens, não pertence particularmente a nenhum, e daí o carácter impessoal do Deus protestante.

Reside aqui, na minha perspectiva, a incapacidade relativa dos povos católicos para o raciocínio abstracto. Cada homem é constituido por uma parte que é comum a todos os outros homens - a chamada natureza humana - e por outra que lhe é privativa ou peculiar - a sua personalidade. Os católicos pôem mais ênfase na segunda, os protestantes mais ênfase na primeira. Na realidade a ideia de personalidade, como o conjunto dos traços que são peculiares a um certo homem e o distinguem de todos os outros, é uma ideia essencialmente católica e que não existe na tradição protestante. Sendo a personalidade distinta de homem para homem, não é possível abstrair elementos comuns acerca dela, e uma teoria geral do homem e da sociedade resulta impossível.

crowdsourcing

30 agosto 2008

kindergarten

A esquerda é a favor da libertinagem sexual e do aborto a pedido (financiado pelo Estado), mas é firmemente contra a pena de morte. Ao mesmo tempo, é contra a liberdade económica. É difícil ser-se coerente, mas isto ultrapassa tudo.
Qual é o fio condutor destas políticas? Penso que é o infantilismo e a irresponsabilidade. Façam o que vos passar pela cabeça que há uns otários a quem o Estado vai sacar umas massas para a pequenada se divertir. Tá-se bem...

29 agosto 2008

psicologia da empresa

De todas as formas voluntárias de associação humana (empresa), o Casamento é a mais fácil de criar e a mais difícil de manter. Para que duas pessoas se juntem sob o mesmo tecto com a finalidade pretendida de constituírem uma lucrativa actividade societária, basta seguirem os seus instintos e as suas emoções mais básicas. Para manterem a empresa em laboração ao longo da vida, é necessário seguir a razão e contrariar os instintos e outras emoções.

A decisão de constituir a empresa Casamento é quase sempre tomada sob o efeito da paixão e da emoção por esse sofisticado tipo de negócio. Como os decisores são, em regra, muito novos e imaturos, não conseguem racionalizar para além dos instintos primários e não concebem sequer que eles possam vir a arrefecer, ou até a mudar de direcção (o que sucede cada vez com mais frequência). Como sabemos, ao fim de um período de tempo mais ou menos breve, é quase sempre isso que sucede.

A procriação, uma das finalidades mais importantes da empresa Casamento, também não obedece a critérios de racionalidade, pelo menos no que toca ao primeiro filho. Este é visto como o prolongamento natural da actividade da empresa, como um resultado líquido quase obrigatório ao fim do primeiro ano de laboração, servindo, muitas vezes, para apaziguar os ânimos que se começam a manifestar desavindos entre os membros do Conselho de Administração. A decisão do segundo filho, mais tardia, já obedece à racionalidade económica normal em qualquer empresa: ela tem em conta a relação custo/benefício do investimento e, como actualmente os custos de manutenção de um filho são elevadíssimos, a maior parte dos empresários matrimoniais opta por não ter mais do que um.

Portanto, se o casamento dos nossos dias obedece ao espírito do “SIMPLEX”, com a facilidade de constituir a empresa em muito pouco tempo, com reduzida burocracia e a custos baixos, a sua manutenção exige outro tipo de esforço e de aplicação. Sobretudo carece de racionalidade.

Na verdade, um empresário matrimonial, do sexo masculino ou feminino, tem, nos dias de hoje, inúmeras solicitações para fazer desviar a sua actividade para muitas outras formas de concorrência desleal. Os apelos são inúmeros, as solicitações frequentes, sendo acompanhados pela progressiva diluição no tempo dos laços que originaram a constituição da empresa-mãe. Por conseguinte, a manutenção da laboração exige, ao fim de alguns (poucos) anos, maior racionalidade e menos emotividade. Isto é, se um empresário matrimonial se limitar a seguir os seus instintos básicos conformadores das emoções próprias do negócio, facilmente mudará de sócios. Outros mudam mesmo de ramo. Ainda por cima, nos dias de hoje, o “SIMPLEX”, do mesmo modo que se aplica à criação da empresa Casamento, também serve para a extinguir com idêntica facilidade.

Na decisão de extinguir a empresa Casamento, o empresário costuma tomar em conta algumas variáveis próprias do negócio: a paz e a tranquilidade social; a rentabilidade económica alcançada; os activos consolidados (casa, filhos; contas bancárias, veículos automóveis; etc.), o passivo existente (dívidas; empréstimos bancários; etc.), os benefícios e os inconvenientes de manter ou de extinguir a empresa, e, muito frequentemente, as propostas da concorrência e os custos de transferência (emocionais, económicos e outros) que terá de pagar. O empresário equilibrado, aquele que não se limita a agir sob o efeito das suas emoções, verifica sempre o saldo acumulado dos exercícios anuais da empresa, antes de tomar qualquer decisão. Muitas vezes, é útil referi-lo, a avaliação deste conjunto de variáveis é feita sem rigor, sob a pressão dos apelos violentíssimos da concorrência. Quando assim sucede, a decisão final é sempre errada e comporta consequências nefastas e irreparáveis para o empresário.

Hoje em dia, cerca de metade das empresas Casamento encerram ao fim de um período de tempo reduzido (de 5 a 10 anos de laboração). Outros empresários preferem acumular clandestinamente alguns serviços prestados à concorrência. E muito poucos se mantêm fieis ao pacto societário original.

sarita

mistério público

Quando um cidadão acusado de crimes económicos é presente a tribunal, o rol das acusações parece interminável:
Peculato, participação económica em negócio, abuso de confiança, corrupção, falsificação de documentos, associação criminosa, branqueamento de capitais, evasão fiscal, etc. A prisão preventiva é então pedida para evitar “alarme público”.
Quando um criminoso violento é apanhado, após um assalto ou tentativa de homicídio, a acusação (segundo a imprensa) é apenas de porte ilegal de arma e o cidadão volta para casa com termo de identidade e residência. Não há alarme público...
Será que o cidadão não resistiu à prisão? Não terá insultado a mãe do policia? (insulto à autoridade), não haverá perigo de fuga? Não terá infringido qualquer regra de transito?

sexo livre

O amor livre teve o seu esplendor nos anos 60 e 70, com o movimento hippie. Na sua essência, este movimento libertário propunha o livre relacionamento sexual entre adultos, sem as limitações ou intromissões do Estado e da Igreja.
É um movimento geralmente considerado utópico por estar desenquadrado das restantes instituições sociais e por não dar resposta satisfatória à necessidade de nos responsabilizarmos pelas crias, uma tarefa de longo prazo que é muito pouco “livre”. Apesar de tudo, a filosofia subjacente ao amor livre teve, na minha opinião, um impacto positivo.

Diferente do amor livre é, porém, o que eu designaria por sexo livre. A prática do sexo pelo sexo, sem envolvimento afectivo e sem grande zelo na selecção dos parceiros. Esta prática, chamada fornicação, é considerada um eufemismo para a prostituição e é moralmente condenável.

As mulheres têm denunciado a cultura do amor livre como uma forma de subjugação sexual aos machos que não sabem aceitar um não e que as acusam imediatamente de pudicas e conservadoras. É portanto útil distinguirmos amor livre de sexo livre.

28 agosto 2008

très populaire


Ma thèse que les ghettos sont des créations juives est en train de devenir très populaire en France (voir ici, ici, ici et ici) .

bipedismo

O bipedismo condicionou, de forma radical, a sexualidade humana. Enquanto nos primatas quadrúpedes os órgão genitais femininos estão expostos e acessíveis, no Homo Sapiens os órgãos sexuais femininos estão escondidos e inacessíveis, na maior parte das posturas.
Este facto concedeu às fêmeas humanas a capacidade consciente de seleccionar os seus parceiros sexuais e permitiu-lhes ascender na hierarquia da tribo. Donas de um tesouro escondido, as fêmeas passaram a poder usar o sexo como moeda de troca, assegurando recursos para si e para as respectivas crias.
Alguns autores vão mesmo ao ponto de especular que este “fenómeno cripto-vulvar” (sic) esteve na base do nosso desenvolvimento cognitivo e emocional. As barreiras à concretização imediata do acto aguçaram o engenho e seleccionaram os mais inteligentes.
Não será portanto de espantar que o "sexo-livre" tenha o efeito exactamente contrário, seleccione os mais abrutalhados.

27 agosto 2008

Adão e Eva

Em que ponto do nosso desenvolvimento é que nos tornamos humanos? Quando provamos os frutos da árvore do conhecimento do bem e do mal. Tornamo-nos humanos quando ascendemos ao conhecimento do mundo que nos rodeia e a razão nos permitiu distinguir o bem do mal.
Nesse momento, descrito na Bíblia *, tornamo-nos mais semelhantes a Deus, enquanto seres existentes, com pleno livre-arbítrio para nos definirmos, mas sem a integração total na natureza de que desfrutam todos os outros seres vivos. Mitologicamente, essa perda é representada pela expulsão do Éden.
Sem a noção do bem e do mal, devemos ser muito claros, regressaríamos à bestialidade. Seriamos inimputáveis pelas nossas acções e nada nos distinguiria da restante fauna.
O primeiro acto consciente de Adão e Eva foi de pudor, taparam os genitais. Como poderemos interpretar esse comportamento? Na minha leitura, esse acto representa a necessidade de controlarmos os instintos animais que transportamos e que, em bruto, degradam a natureza humana.

* Génesis: 2, 16
“Podes comer os frutos de qualquer árvore do jardim; 17 mas não podes tocar na árvore do conhecimento do bem e do mal, porque se comeres os seus frutos morrerás.”

26 agosto 2008

primatas

Nós somos indivíduos da espécie Homo Sapiens (subespécie Sapiens). Somo os únicos primatas vivos desta espécie, os únicos que sobreviveram até à actualidade. Os nossos parceiros mais próximos, o Homo Sapiens Neanderthalensis, extinguiram-se há mais de 30.000 anos, ou porque não se adaptaram às mudanças ambientais ou porque o convívio connosco lhes foi fatal.
Mais de 3 milhões de anos nos separam da simpática Lucy, contudo não há uma ruptura entre a sua linhagem e a nossa, apenas uma evolução. Somos mais corpulentos, mais fortes e mais inteligentes, mas partilhamos as mesmas emoções básicas: o amor, o medo, a mágoa e a raiva (William James). Estas emoções, isoladas ou combinadas, orientam o nosso comportamento para um destino comum que é crescermos e multiplicarmo-nos.
E é “crescermos e multiplicarmo-nos” (Génesis) o que temos vindo a fazer, com sucesso assinalável, desde que saímos de África há 200.000 anos. Com tanto sucesso que actualmente somos os mamíferos de grande porte mais representados no mundo (mais de 6,5 biliões).
Qualquer análise filosófica sobre a condição humana, qualquer tratado de política ou de sociologia, tem de partir desta constatação sobre a nossa natureza. Infelizmente, em Portugal, a maior parte dos intelectuais desdenha e ignora olimpicamente a biologia, a genética, a fisiologia, a fisiopatologia, a patologia, a anatomia ou até a psicologia. Por isso, muitas das suas opiniões não passam de construções abstractas que flutuam no éter, sem qualquer ligação à realidade.

a empresa

Não existe empresa mais difícil do que o Casamento. Ele nasce, quase sempre, de um pacto social estabelecido sob precárias condições de limitada racionalidade (o amor, a paixão), visa a criação de condições financeiras e materiais que permitam uma melhoria constante e progressiva da vida dos sócios, cria um número de clientes (os filhos) que dependem, por tempo indeterminado, do sucesso da empresa, e deverá perdurar enquanto não falecer um dos dois sócios, isto é, por toda uma vida. Para além disso, trata-se da única empresa em que os sócios são obrigados a pernoitar juntos todos os dias das suas vidas, a cumprirem determinadas obrigações recíprocas com um entusiasmo semelhante ao da primeira vez, e a manterem uma rigorosa relação de exclusividade que os impede de partilharem a sua vocação empresarial com outros potenciais sócios.

A empresa Casamento gera outra que é a empresa Família. A Família é mais exigente ainda do que o Casamento. Tem obrigações regulares (visitas, festas, aniversários, datas festivas), impõe solidariedades parentais, gera uma clientela exigente (sobrinhos, primos, sogros, avós e netos), e obriga à cortesia, à amabilidade, ao «deixa lá, não lhe vás às fuças que é teu primo», e até à perpetuidade do sogro (e da sogra…) mesmo que sobre o casamento original já declarado extinto tenham vencido mais quatro ou cinco.

O estatuto societário do «sogro» é, aliás, único no mundo empresarial. Ele pode fazer o que entender, chamar aos outros sócios os nomes que lhe apetecer, locupletar-se abundantemente com um capital social que não lhe pertence em jantaradas e almoços na sede da empresa, que resiste a tudo, até mesmo ao fim da empresa. Vá lá Deus saber porquê, uma vez sogro, sogro toda a vida. É mais ou menos como o Major Valentim Loureiro continuar a ser presidente honorário do Boavista, mesmo depois do clube deixar de existir.

Posto isto, há que ser justo e reconhecer que a Família e o Casamento são as duas instituições nucleares da nossa vida em sociedade. E que o empresário que as consiga manter pelo tempo firmado no contrato social – toda a sua vida – é digno de reconhecimento e de admiração. Infelizmente, como é sabido, há cada vez menos empresários bem sucedidos em Portugal.

25 agosto 2008

um velho problema

até que a morte os separe

É claro que, como diz o Pedro Arroja, no casamento "os cônjuges têm sobretudo deveres, deveres que são para com os filhos". Estamos nisso perfeitamente de acordo e não serei eu a contrariá-lo. Mas do que nós estamos a falar não é do casamento, mas sim do divórcio. Isto é, da dissolução jurídica e factual de um vínculo contratual e pessoal, momento em que se devem acautelar os interesses dos filhos nascidos e responsabilizar os seus progenitores para que continuem a cumprir os seus deveres de pais. Ou seja, obrigá-los a cumprirem os seus deveres para com os filhos, mesmo para além do casamento.

Trata-se, também, de poupar os filhos a divórcios tumultuosos em que são frequentemente utilizados como arma de arremesso entre os cônjuges, ora por capricho pessoal, ora por vingança emocional, ora para conseguir o direito à casa de família ou a uma pensão que poupe uma das partes a essa condenação bíblica que é o trabalho.

Seja qual for a forma como se olhe para o casamento - como um contrato, como um juramento solenemente prestado perante Deus ou como uma simples ligação circunstancial entre duas pessoas – a possibilidade delas se separarem é um facto intransponível, tão antigo como o mundo, e que a modernidade conduziu à vulgaridade. Bem ou mal, interessa pouco: é nela que vivemos. Nos dias que correm, por exemplo, em Portugal, estima-se que cerca de 50% dos casamentos terminem em divórcio num período muito curto de 5 anos. Nesse tempo os casais têm de um a dois filhos.

Ora, é precisamente para estes casos, onde a família nuclear se desfez e em que, por consequência, o casamento já não protege ninguém e muito menos os filhos, que é necessário encontrar soluções que minimizem os prejuízos que sobre eles habitualmente recaem nestas ocasiões. Do que se trata, portanto, é de estipular regras que acautelem o futuro dos filhos em caso de desentendimento dos pais, e fixá-las a montante e não a jusante. Isto é: quando eles ainda se dão bem e não quando eles já se dão mal. Regras que, de resto, o direito deverá enquadrar e balizar.

Havemos todos de convir que provavelmente se encontrarão melhores soluções no princípio do que no fim de uma relação, que, queira-se ou não, é sempre marcada pelo sentimento e pela emotividade.

do poder paternal

Um leitor deixou neste meu post sobre o divórcio o seguinte comentário:

"A sua solução não é tão sensata como parece. A regulação do poder paternal visa acautelar, em primeiro lugar, o interesse dos filhos. Ás vezes este interesse não coincide com o interesse do casal (ainda que estes estejam de acordo) e quando esse conflito acontece a vontade dos pais (mesmo concertada) não prevalece.
Por isso, o poder paternal não pode ser previamente regulado - tipo elemento a ter em conta na convenção antenupcial - e mesmo quando o casal ou ex-casal está de acordo na regulação, o MP tem que se pronunciar. Não se pense que é uma mera formalidade. Um acordo em que, por exemplo, não esteja acautelado o mínimo de contacto entre o pai e o filho dificilmente é aceite por se considerar que, em princípio, lesa os interesses da criança."


Segue aqui um bom exemplo da regulação judicial do poder paternal:













E não se julgue que este é um caso único. Ele é somente um caso mediático...

dream team


Desde ontem que eu tenho vindo a trabalhar para pôr de pé aquilo que no meu espírito seria um dream team - a zazie, o Euroliberal e eu próprio - para debater este tema, mesmo em estrangeiro, mas parece que não temos adversários à altura.

E não há mais conversa


Eu vivia na America do Norte no final dos anos setenta quando por lá se aprovavam as primeiras leis do divórcio sem culpa (no fault divorce). Hoje essas leis estão lá em franca regressão, como a própria taxa de divórcio, porque conduziram onde era previsível que levassem - a uma explosão dos divórcios com a consequente vitimização das crianças, em primeiro lugar, e das respectivas mães em segundo.

Em nome de ideias modernistas, invariavelmente importadas de fora e com trinta anos de atraso, ver agora as mesmas leis, destinadas a produzir os mesmos efeitos, serem impostas em Portugal causa-me profunda indignação. Por isso, a propósito deste tema (e de vários outros), eu já não tenho paciência para debates e espero que os meus leitores compreendam isso. Eu próprio já criei uma família, em breve serei avô, e se viver até à idade correspondente à esperança de vida do homem português, tenho mais oito mil dias para viver. Já não tenho tempo para debater o óbvio. Cada dia representa 0.0125% da minha esperança de vida restante.

Sobre temas como a família ou o casamento considero que já tenho muito pouco a aprender, se é que tenho alguma coisa a aprender. Por isso, as minhas opiniões sobre este tema não devem ser entendidas como teses. Devem ser vistas como a verdade de forma razoavelmente aproximada. Quem quiser compra, quem não quiser não compra. E não há mais conversa.

Eu tenho grande dificuldade em compreender como pessoas que nunca criaram uma família, ou que foram incompetentes para criar uma família ou para manter um casamento, como é público acerca do primeiro-ministro português, ousam alterar as leis que regulam a família e o casamento.

Romeu e Julieta


O amor não é um sentimento essencial à instituição do casamento. A instituição é agnóstica em relação aos sentimentos que movem os cônjuges. Ao longo da história da instituição, os sentimentos dominantes que acompanharam o casamento foram o interesse e a necessidade, mas não foram raros os casos em que o casamento foi acompanhado de ódio ou de compaixão. O amor como sentimento que acompanha o casamento é relativamente recente, e ainda assim só prevalecente nos países ricos. Neste sentido, o casamento acompanhado de amor é literalmente um luxo.

Nem o amor é essencial ao casamento, nem o casamento é a instituição ideal para fomentar o amor entre os conjuges. Os casos célebres de amor, como o de Romeu e Julieta, nunca envolveram um homem e uma mulher casados entre si. Um homem ou uma mulher que queira viver em situação de êxtase amoroso permanente nunca se deve casar - e muito menos ter filhos. Pelo contrário, deve passar de uma paixão para a seguinte logo que o ardor da anterior se extinga.

O casamento não foi concebido para regular os sentimentos que animam os conjuges. Discutir o casamento (e o divórcio) em termos dos sentimentos que acompanham os cônjuges, como o amor, o interesse ou a necessidade, falha totalmente a sua natureza original e não pode senão conduzir à degradação da instituição. O casamento foi concebido para proteger os filhos e, neste sentido, para proteger e favorecer a reprodução da espécie. Secundariamente, o casamento visa proteger aquele dos dois cônjuges que, a grande distância do outro, mais investe na criação da família - a mulher.

A ideia do casamento como um contrato, que resultou da laicização da instituição, é ainda mais errónea porque coloca o ênfase nos conjuges e nos seus respectivos direitos e deveres. O casamento não é um contrato, mas uma promessa solene ou sagrada, um juramento, por parte de ambos os conjuges de cuidarem em conjunto dos filhos que vierem a nascer da união, ou que já tenham nascido. É por esta razão que o casamento entre homossexuais não tem sentido, e não deve ser tolerado.

Num casamento, os cônjuges têm sobretudo deveres, deveres que são para com os filhos. É precisamente porque o casamento e a instituição a que ele dá origem - a família - é sobretudo uma fonte de deveres para os cônjuges, e não de direitos, que a discussão do casamento e do divórcio em termos de direitos dos cônjuges não pode ser senão o fruto da imaturidade - a imaturidade própria de quem ainda não teve a oportunidade ou o gosto para criar uma família, ou falhou no empreendimento, ou quer acabar com a instituição.

o contrato

Eu concordo com o Pedro Arroja: a lei não deve, em circunstância alguma, permitir que uma parte envolvida num contrato o revogue unilateralmente, sem que para isso não existam razões fortes, necessariamente fundamentadas. Como o casamento é um contrato, não vejo que a sua dissolução possa (ou deva, porque poder pode) ser meramente unilateral, sem qualquer outro fundamento que não seja a perda de interesse em mantê-lo por uma das partes.

Todavia, nem uma lei conservadora, nem uma lei liberalizadora quanto aos pressupostos do divórcio, são capazes de precaver, ou reduzir significativamente, os danos causados às principais vítimas do termo contratual: os filhos. Ao contrário do que pensa o Pedro, o regime jurídico do casamento está longe de proteger eficazmente os filhos, que são sempre utilizados como arma de arremesso e forma de chantagem pelas partes envolvidas num litígio matrimonial. Quanto a isto, a lei quase nada diz e deixa ao bom senso dos pais (que, nestas circunstâncias, raramente existe) e à sabedoria dos tribunais (quase sempre tardia e unilateral em favor dos direitos das mães) o destino dos filhos. Ela protege o vínculo, pode dificultar mais ou menos o seu fim, mas não defende os filhos.

Por isso, eu só vejo uma saída sensata: a de retirar todos os pressupostos emocionais e religiosos ao contrato de casamento civil, e considerá-lo, em absoluto, como um contrato firmado entre duas pessoas que livremente o celebraram. Tratando-o como um simples contrato civil, nada obsta a que ele contenha cláusulas que determinem o futuro dos filhos menores (poder paternal, educação, pagamento dos custos, regime de visitas e férias, etc.), na eventualidade da dissolução do vínculo jurídico matrimonial. Essas normas poderiam evitar, ou pelo menos reduzir, as consequências traumatizantes para os filhos (e também para os pais, que veriam os seus instrumentos de conflitualidade consideravelmente diminuídos) de um divórcio conflituoso, e não ofenderiam o espírito da instituição.

Lucy



















Lucy: 1,20 m; 34 C (com pareja)

24 agosto 2008

son père couche avec sa mère


"Ma fille vient de découvrir à dix-huit ans que son père couche avec sa mère", confidenciou-me um dia um colega atormentado em lidar com os problemas de adolescência da filha.

A observação é, no entanto, reveladora de um facto essencial da visão que os filhos possuem dos pais, que é o seu total agnosticismo acerca da relação que existe entre os pais. Excepto, talvez, perante manifestações extremas de amor ou ódio, a questão de saber se os pais se amam ou não é uma questão totalmente irrelevante aos olhos dos filhos e que jamais lhes ocorre ao espírito. Este agnosticismo é perfeitamente racional, pois aquilo que os filhos esperam dos pais é que estes os protejam, os eduquem e os alimentem, sendo para eles secundário, senão mesmo irrelevante, que os pais se amem ou não.

A discussão acerca do recente veto presidencial à lei do divórcio sem-culpa (no-fault divorce) tem incidido sobretudo sobre os direitos e deveres dos cônjuges. O foco da discussão está claramente mal colocado, porque a instituição do casamento e, consequentemente, a do divórcio, não foram feitas para proteger os conjuges. A instituição do casamento foi feita para proteger os filhos. Na realidade, a que propósito deveriam a moral e a lei preocupar-se acerca da regulação das relações íntimas entre dois adultos? Não se vê razão que o justifique.

A instituição do casamento foi criada para proteger os filhos - e não o homem e a mulher que decidem partilhar a sua intimidade -, e, nesse sentido, o casamento é a instituição, por excelência, que visa proteger a procriação. E o principal interesse dos filhos é o de que os pais estejam juntos para os proteger, os educar e os alimentar, independentemente de se amarem ou não, uma questão que, não é de mais insistir, do ponto de vista dos filhos é absolutamente secundária senão mesmo irrelevante.

É para proteger quem não se pode proteger a si próprio - os filhos, não os adultos que são seus pais - que a lei deve dificultar, e dificultar ao máximo, o divórcio. Por isso o veto do Presidente a uma lei que pretende facilitar o divórcio foi muito bem aplicado. É possível que a lei volte à Assembleia da República e acabe por ser promulgada. Eu não ficaria surpreendido. As leis da multidão e dos representantes da multidão não reconhecem ninguém que não tenha voz para se fazer ouvir. Há poucos meses, no resultado do referendo, foi promulgada uma lei que permite matar todas as pessoas que tenham menos de dez semanas no útero materno. A nova lei do divórcio vota ao desprezo as crianças que não se podem fazer ouvir, em benefício das traquinices, dos amores de ocasião, ou do enfado, de algum dos seus pais ou de ambos.

desfrutar

Os parques e jardins dos países anglo-saxónicos são para desfrutar e os dos países latinos são para contemplar. Em Nova Iorque, o Central Park é um espaço que a população utiliza e vive intensamente. Os relvados servem para brincar, correr, saltar, apanhar um banho de sol ou fazer um piquenique. Faz-se lá jogging, anda-se de patins ou skate, ou simplesmente repousa-se. Quando lá fui a última vez, uma cantora de ópera ensaiava uma ária, para júbilo dos passantes.
Pelo contrário, no Jardin del Buen Retiro, no centro de Madrid, é proibido pisar a relva, não há espaços de lazer e os visitantes apenas podem contemplar a maravilhosa variedade botânica e o virtuosismo dos jardineiros, demonstrado pela resultado artístico dos seus trabalhos.
Nos países anglo-saxónicos contam mais as acções e nos latinos a imagem (ver posts de PA sobre este tema). Daí que nos primeiros se desfrute pela acção e nos segundos pela contemplação.
Talvez em relação às mulheres se passe o mesmo fenómeno. As anglo-saxónicas apresentam-se de forma minimalista, mas é para serem desfrutadas à balda, pelo primeiro que apareça. Já as latinas preocupam-se muito mais com a imagem, são mais estimulantes para os sentidos e não são, por assim dizer, de “abertura fácil”.

23 agosto 2008

ibéria

Enquanto a rivalidade entre Portugal e Espanha diminui, a rivalidade entre as autonomias aumenta. Deixem-me desde já esclarecer que esta afirmação é meramente especulativa e que o único fundamento que tem é a minha experiência pessoal.
Por motivos profissionais, há vários anos que passo bastante tempo em Espanha, especialmente na Galiza e em Madrid. Constato então que os portugueses são cada vez mais bem recebidos, que os espanhóis têm curiosidade sobre o nosso País e que gostam de nos visitar. Muitos amigos meus partilham desta opinião e alguns até obtiveram a dupla nacionalidade, que os espanhóis concedem aos portugueses com bastante facilidade.
Pelo contrário, as relações entre as autonomias, em Espanha, tem vindo a deteriorar-se e, ano após ano torna-se mais difícil. Neste momento, os catalães estão a criar dificuldades ao Governo na aprovação do orçamento de Estado para 2009. E os bascos (a ETA) recusam o TGV que iria “violar a terra-mãe”. Presumo que, em Portugal, não há uma única voz contra o TGV por este ligar os dois países.
Em Portugal, as autonomias, os Açores e a Madeira, beneficiam da insularidade que os distancia do continente. Açorianos e madeirenses, contudo, não estão particularmente enamorados de nós e este sentimento parece-me recíproco. Pensamos, no continente, que os ilhéus vivem à nossa custa e isso cria dificuldades.
Se me pedissem uma explicação para este hipotético fenómeno diria que a rivalidade entre as autonomias é um facto ampliado pelos governos centrais que, pelas suas políticas, beneficiam (ou parecem beneficiar) uns mais do que outros, sugerindo a ideia de filhos e enteados, e estimulando disputas. Claro que este fenómeno não existe entre Portugal e Espanha e talvez aí resida a razão de ser do nosso bom relacionamento.

22 agosto 2008

quem é rico?

Se o tema da pobreza incomoda muita gente, imagino que o da riqueza incomode muita mais. Quem é rico? Que rendimento nos qualifica para sermos ricos? O tema entrou na campanha eleitoral, nos EUA, e eis as diferenças entre McCain e Obama. Para McCain o limiar da riqueza está nos US$ 5.000.000,00 /ano e para Obama está nos US$ 250.000,00 /ano. Uma diferença abissal, com consequências práticas muito concretas.
Se Obama ganhar as eleições irá aumentar os impostos para todos os agregados familiares que aufiram mais de US$ 250.000,00 /ano, o que significa que terão de viver com pouco mais de metade. O problema de Obama é que uma família média (ex.: enfermeira + polícia), nos EUA, ultrapassa com facilidade a fasquia de riqueza que ele próprio definiu e portanto a ideia de que só irá aumentar os impostos aos ricos cai pela base. É por estas e por outras que a estrela de Obama cada vez cintila menos.

pobreza nos eua






PA tem toda a razão quando afirma que nunca conseguirei convencer alguém, em Portugal, de que não há pobreza significativa nos EUA. Mesmo assim, aqui fica mais um estudo sobre o assunto, da Heritage. Segundo este think-tank, os pobres nos EUA vivem com melhores condições económicas do que a classe média na Europa e no Japão:

Better Off Than Europeans, Japanese

The average "poor" American lives in a larger house or apartment than does the average West European (This is the average West European, not poor West Europeans). Poor Americans eat far more meat, are more likely to own cars and dishwashers, and are more likely to have basic modern amenities such as indoor toilets than is the general West European population.
"Poor" Americans consume three times as much meat each year and are 40 percent more likely to own a car than the average Japanese. And the average Japanese is 22 times more likely to live without an indoor flush toilet than is a poor American.

21 agosto 2008

Barajas

Uma repórter ainda ofegante dava-nos conta, num dos noticiários de ontem, das dificuldades que os jornalistas enfrentaram para cobrirem o desastre de Barajas. As autoridades locais teriam estabelecido um perímetro de segurança em torno do local do acidente para controlarem o registo e a divulgação da catástrofe, em particular, “a visão dos cadáveres e dos corpos desmembrados” (sic).
Num acidente desta magnitude pede-se contenção aos mensageiros da notícia. Filmar as vítimas seria obsceno, típico do terceiro-mundo. Não nos fartámos já de ver as vítimas do terrorismo no médio-oriente? Contudo, a referência da repórter tem um carácter simbólico. Pergunto, interessa a alguém ver os restos humanos mutilados, depois de um acidente? Com certeza! A toda a clientela boçal e rústica que constituí a actual massa dos telespectadores. Sabe-o a jornalista e sabemo-lo nós.
De onde vem este interesse pelo macabro? A resposta é cristalina: De 200.000 anos de selva. De uma época em que o canibalismo era a norma e o desmembramento dos cadáveres era imediatamente seguido pelo respectivo consumo, que aliás poderia representar a única possibilidade de sobrevivência. O desmembramento evoca ainda a desordem e o caos, contrários à autoridade patriarcal ou fálica, outro membro que é necessário castrar para que impere a anarquia.
Um acidente tão trágico como o de Barajas pode servir para questionarmos os fundamentos do nosso jornalismo, em particular do jornalismo televisivo. A curiosidade mórbida é um facto e terá as suas explicações psicológicas, mas nunca, em caso algum, deve ser explorada. Repito, pede-se grande contenção aos mensageiros das más notícias.
Que Deus nos ajude, porque só Ele nos pode tirar da selva.

20 agosto 2008

Nuestros hermanos


"O 'The Economist' avisa que Espanha está na bancarrota", destaque do Diário Económico de hoje.

Será que o "subprime" ibérico, habilmente escondido nas Cajas espanholas, virá ao de cima?

as duas espanhas

Há duas Espanhas em Espanha. A Espanha do futuro que aposta na capacidade de realização dos espanhóis, e a Espanha do passado que vive de ilusões e que rejeita a realidade.
Em Madrid, as duas Espanhas estão bem representadas nos principais bairros da cidade. O Barrio de Salamanca, ou Madrid A (de alta) e os Barrios de La Latina e Los Austrias, ou Madrid B (de baixa).
Passear pelo Barrio de Salamanca, dar uma volta pelo Jardin del Buen Retiro, ou subir o Paseo de Recoletos e tomar um café no Café de Gigón, é uma experiência idêntica a passear em Nova Iorque. Pelo contrário, espreitar as zonas de La Latina, ou Los Austrias, evoca uma “bad trip” pela Tunísia ou pela Argélia.
Talvez todos os países vivam com um pé no passado e outro no futuro, como é tão evidente, por exemplo, na Índia. Pelo menos para os espanhóis, em Madrid, estas duas realidades estão lá bem patentes para serem confrontadas. Podemos resignarmo-nos com Los Austrias ou aspirar ao Barrio de Salamanca.

pobreza extrema no hay

Sexta-feira passada era “festivo” em Espanha e Madrid estava deserta, um choque para quem mal tinha acabado de chegar de Nova Iorque. No táxi, de Barajas para o bairro de Salamanca, conversei com o condutor sobre a crise económica espanhola e procurei indagar se ele conseguia relacionar, de algum modo, a crise com a baixa produtividade dos espanhóis, com as suas famigeradas férias de 30 dias, “festivos” e “siestas”. Na América, disse, quase ninguém tira mais de uma semana de férias por ano..
-És por esso que yo vivo en España!
-Podemos sempre optar por ser pobres, comentei.
-En EEUU hay muchos pobres.
Expliquei-lhe então que na América não há pobres. Aliás, também não há pobres em Espanha e até na maior parte dos países da UE.
Depois de reflectir um pouco, disse-me: - Sí, pobreza extrema no hay. Ni en España, ni en EEUU.
Gracias. Ao melhor estilo yankee, dupliquei-lhe a “propina”.

19 agosto 2008

Tóxico


O JN de hoje dedica uma página inteira à diminuição nas vendas de preservativos. Segundo os dados citados pelo jornal, em 2008 venderam-se em média 56 mil embalagens por mês - cerca de 10% menos que em 2007. Esta redução vem na sequência de outras semelhantes registadas desde 2004. Não pretendo com este post voltar a uma discussão antiga, entretida neste blogue, acerca da frequência com que os casais portugueses "resolvem". Preferia, sim, dar a minha opinião no sentido de tentar explicar esta redução na venda de preservativos. E a forma de a combater.

Primeiro, como todos os jovens da minha geração, que se iniciaram sexualmente na década de 90, também eu sempre me senti perseguido pelas campanhas de prevenção contra a Sida. De forma que, sempre que posso, procuro ler sobre os avanços da ciência no combate ao HIV. Do que leio, retiro a seguinte conclusão: a ciência está já bastante avançada e, hoje, já ninguém morre de Sida - apesar da notória perda de qualidade de vida e do estigma social, infelizmente, a ela associada. Os tratamentos são pagos pelo Estado e a doença está em vias de ser rotulada como crónica. Em certo sentido, as relações sexuais deixaram de ser uma arma de destruição maciça. Ainda bem!

Segundo, o preço. Sempre me pareceu que cada embalagem de preservativos é muito cara. Nas farmácias, o preço médio por unidade anda perto de um euro. É claro que podemos sempre ir ao supermercado e comprar uma marca de qualidade inferior, mas nesse caso, o nosso tuga arrisca-se a que a coisa rebente a qualquer momento. O preço que se paga por um preservativo de qualidade parece-me excessivo. Além disso, se realmente queremos valorizar a prevenção - sim, porque a abstinência é uma patetice - o Estado podia antes subsidiar a compra dos preservativos. Provavelmente, teria um valor simbólico e, como contrapartida para o Estado, permitir-lhe-ia poupar todos os meses algumas centenas de milhares de euros nos tratamentos com doentes infectados.

Terceiro, e mais importante, o cheiro! Palavra. Não estou a gozar. Na minha opinião, o que mais afasta os portugueses dos preservativos, em particular os homens, é o cheiro da coisa - do preservativo entenda-se. É que já não bastava ter de interromper o processo, com todas as peripécias que podem acontecer pelo meio incluindo vestir o fato borracha ao contrário ou deixar que a miúda arrefeça, como ainda temos de aturar o maldito odor. E não vale a pena comprar preservativos com sabores que cheira sempre tudo ao mesmo: LATEX. É um problema porque o cheiro a Latex é das sensações menos excitantes que podem existir. E é um duplo problema porque aquela porcaria emprenha-se por tudo o que é sítio - na roupa, nos lençóis, nas mãos.

Por isso, a minha sugestão é muito simples: um avultado prémio monetário para o primeiro investigador que consiga chegar a um material alternativo ao Latex! Talvez assim, com "fatos borracha" feitos de outro material qualquer, mais bem cheiroso, se consigam vender mais preservativos. Em Portugal e em todo o mundo.

candonga

Chegado de Nova Iorque, tive uma recepção inesquecível no aeroporto Francisco de Sá Carneiro, que seria falsa modéstia não partilhar convosco, até porque reflecte o estado do nosso Portugal Contemporâneo.
Depois de seguir as indicações de “saída e “nada a declarar”, fui interpelado por um funcionário da alfândega que, após confirmar que regressava dos EUA, me solicitou que passasse a uma sala ao lado, onde as nossas bagagens foram examinadas a pente fino.
Informei o Sr. Inspector de que não transportava qualquer valor, mas esta informação rapidamente se revelou falsa. Depois de minuciosa inspecção, os zelosos funcionários detectaram três peças de vestuário adquiridas nos States e que, segundo me informaram, constituíam uma importação ilegal.
-Ilegal? Perguntei com cara de morcão. São apenas uns “recuerdos” atalhou a Isabel.
-Recuerdos? –São produtos têxteis, sujeitos a tarifas pesadas.
Depois de apelar inutilmente ao bom senso, fui confrontado com a realidade dos factos: Taxas aduaneiras, + IVA, + coimas por ter passado pela alfândega sem saber que estava a cometer um crime, tudo somado 500.00 € (em contas redondas). Pelos vistos, apenas podemos entrar com compras, feitas fora da UE, até um valor de 175.00 €, por pessoa. Surpreendente, não?
Já cá fora, mas ainda estupefacto, fui abordado por um tipo emigrado em Newark que me perguntou:
- Entom? Quanto foi o tombo? Respondi-lhe que tinha pago 500.00 €.
- Bocê, desculpe que lhe diga, mas foi muito trouxa. A gente bem carregado com tudo e não pagámos um tostão. Tirámos as etiquetas de tudo e a minha mulher até enfiou este casaco. Tá a ber este relógio?
- Tenho que lhe dar razom! Fui muito trouxa...
Num País pobre, os cidadãos têm de andar sempre com uma mão à frente e outra atrás. Vou continuar a viajar para Nova Iorque quando muito bem me apetecer, vou continuar a comprar alguns “recuerdos” nos States e não tenciono arrancar-lhes as etiquetas, mas para a próxima vou por Barajas e ainda passo uns dias em Madrid.

TV

A televisão nos EUA é deplorável, intragável, obscena, faltam-me adjectivos. É uma espécie de síntese do pior da TVI, com o pior da SIC e o pior do CN1. Já nem me refiro às Oprahs e afins, apenas aos noticiários.
As notícias verdadeiras, concentradas em 15 segundos, alternam com as pseudo-notícias, as entrevistas sucedem-se a um ritmo alucinante, apenas sobre emoções. O que sentiu? O que imaginou? O que gostaria de fazer?
Os entrevistados são muitas vezes a escória social, delinquentes, presos, marginais de todo o tipo, a quem se dá tempo de antena e credibilidade. É a sociedade do espectáculo no seu esplendor!
Como reflexo desta realidade, a publicidade destina-se apenas à ralé: Na Fox News, a publicidade é pouca e é apenas de agências que resolvem problemas de insolvência, compras por impulso e pouco mais.
A minha surpresa com esta situação resulta de dois factos: Em primeiro lugar, a degradação tem sido progressiva. Em segundo lugar, os sites noticiosos dos canais das televisões norte-americanas não reflectem cabalmente as programações. Ora como internauta tinha fabricado uma imagem diferente, por exemplo da Fox News.
A internet permitiu uma segmentação do mercado inimaginável há 5 ou 10 anos. Com a banda-larga e o vídeo na net, as elites desligaram a TV. O mesmo que se está a passar por cá.

18 agosto 2008

the Chief Inquisitor


John L. Allen, Jr's Pope Benedict XVI (N. York: Continuum, 2005) is a remarkable book. It was first published in 2000 under the title Cardinal Ratzinger: The Vatican's Enforcer of the Faith. The book is thus a biography of Joseph Ratzinger before he became Pope, a critical, though balanced biography. The author is a Catholic, American journalist with liberal leanings. As the title of the original edition of the book suggests, Joseph Ratzinger is portrayed as the Chief Inquisitor of the Catholic Church. Indeed, before becoming Pope Ratzinger was for more than twenty years the Prefect of the Congregation for the Doctrine of the Faith, a Vatican curia formerly known as The Inquisition.

I have the feeling that the book was written with the intention of disqualifying Ratzinger as a candidate for the papacy. Reading the book in this perspective, it seems to me that Ratzinger was actually a very good choice. It is clear that the author views the Church as a this-world institution which should adapt herself to the demands and fashions of time and culture, such as recognizing gays' rights, allowing abortion, and ordaining women priests. On the contrary, the Pope sees the Church as the guardian of a set of universal and eternal beliefs, values and principles which the Church should uphold even at the cost of being unpopular.

Between these two contrasting views, I tend to fall on the Pope's side, not the least because I admire the Pope's courage to be unpopular. This is in my view the most important feature of a true intellectual, which is what Ratzinger is. Contrary to most previous Popes who did their careers mainly as priests, Ratzinger was a priest only for a short period of his life. He did his career mainly as an academic theologian. This is the Pope that the Church needs - a doctrinaire. I believe he will be remembered as one of the most important Churchman of the last several centuries as he is trying to put the Church where the Church really belongs, as an other-world institution.

EU versus USA










O think-tank Timbro, sueco, publicou em 2004 um estudo intitulado EU versus USA, que recomendo a todos os que se interessem pelo tema da pobreza. A propósito da pobreza nos EUA, realça-se neste estudo que:

45,9% dos pobres, nos EUA, são proprietários da sua habitação.
72,8% têm carro.
30,2% têm 2 ou mais carros.
76,6% têm ar condicionado em casa.

Se aplicássemos aos suecos os mesmos critérios utilizados para determinar a taxa de pobreza nos EUA, 40% dos suecos seriam pobres.
Mas os factos não contam...

Maio de 68

“Visitante da Eurodisney (um Chernobyl cultural), telespectador de Morangos com Açúcar * (um campo de concentração mediático), devorador de Big Mac (um Auschwitz culinário): Estou descentrado, desassossegado, degenerado, desarticulado, descarnado, deslocalizado, desconcertado, decomposto, desnaturalizado, descolectivizado, desordenado, desvirilizado, desmembrado... Triste por não ser mais do que um “des” e por viver no “já não””.

André Glucksman, em: Mai 68 expliqué à Nicolas Sarkozy
* Na versão original o autor referiu a série Loft.

14 agosto 2008

pobres?

Onde estão os pobres? Perguntou-me, retoricamente, a Isabel durante a nossa recente visita a Nova Iorque. N’América não há pobres, respondi-lhe.
Como? Nos EUA não há pobres? O Sr. deve estar louco, posso ouvir comentar... Mas a verdade, se é que esta interessa, é que não há pobres nos EUA. Passo a explicar porquê:
Os EUA foram um dos primeiros países do mundo, se não mesmo o primeiro, a instituir o “rendimento mínimo garantido”, lá pelos anos 30, e ao longo do tempo foram incrementando esta benesse com um conjunto alargado de medidas sociais que englobam o direito à habitação, à saúde, à educação, etc.
Qualquer destituto, portanto, dispõe de abrigo, dinheiro para o bolso e acesso a um conjunto de serviços que custam milhares de dólares a adquirir. Está estimado que, em média, o Estado gasta com cada cidadão dependente cerca de US $18.000,00 /ano. Ora com este rendimento podemos afirmar, com certeza, que na América não há pobres.
Claro que existe um outro fenómeno, que pode ser confundido com a pobreza, que são os “homeless”. Trata-se de um fenómeno que surgiu depois dos anos 80, com o encerramento da maior parte dos hospitais psiquiátricos. Muitos alcoólicos e toxicodependentes também engrossam o número dos “homeless”, mas estas pessoas escolheram, por assim dizer, este estilo de vida, e recusam-se a ser integrados socialmente. Não são pobres, no sentido estrito do termo.
Concluo com a minha afirmação inicial, n’América não há pobres.

mundo dos vivos

Os seniores já (re)começaram a trabalhar. Não entre nós, claro, mas nos EUA. A presença de seniores, com mais de 70 anos, já se tornou banal em muitas instituições e estabelecimentos comerciais norte-americanos.
Nos museus e nas bibliotecas, os seniores dão informações, acompanham os visitantes e esclarecem quaisquer dúvidas que surjam. Nas lojas, ajudam os clientes a escolherem as suas compras e fazem um certo interface com os funcionários mais jovens. Em NY até é possível, nalguns casos, os seniores trabalharem em part-time para “atenuarem” os impostos municipais, uma ideia brilhante.
Presumo que algo de similar se estará a passar nas escolas e nos hospitais. Não se trata de voluntariado, mas de trabalho remunerado que é desenvolvido numa capacidade própria e com um ritmo particular. Na minha opinião, o regresso dos seniores ao mundo dos vivos é uma bênção de que todos beneficiam. Preparem-se que a moda vem aí.

London

Caro PA,
Deixe-me recomendar-lhe dois restaurantes em Londres. Em Covent Garden tem o Rules, a especialidade da casa é o Steak & Kidney Pie. Como este prato demora um pouco a preparar entretenha-se com umas ostras (Oysters from the Duchy of Cornwall) e champanhe como entrada. Depois deste tratamento estou certo de que até as inglesas terão o glamour das latinas.
Em Piccadilly tem o Livebait's Cafe Fish (Rupert Street), mais ligeiro mas igualmente recomendável.
Enjoy!

I can't wait


I am flying to Britain today. I can't wait. In a few hours I'll be sitting in a Londonian restaurant having my preferred dish: fish and chips. It is like taking a sunbath in a Swedish beach.

13 agosto 2008

in God we trust

Crise, mas que crise? Quem se deslocar, nesta época do ano, aos EUA, deve estar preparado para um grande choque. Depois de meses e meses a ouvir falar da crise norte-americana, o que vai constatar é que, para o cidadão comum, não parece haver qualquer crise.
Os hotéis estão ocupados a 100%, o restaurantes estão cheios, o comércio está forte e sente-se um ar de confiança na população. Em particular, nas grandes cidades, o turismo está como nunca, beneficiando da baixa do dólar.
A crise dos ricos não tem nada a ver com a crise dos pobres. Vejamos, se o PIB /capita for de US $40.000,00 e a economia, em vez de crescer 4 ou 5%, apenas crescer 0,5%, o rendimento médio deixa de crescer US $2.000,00 para apenas crescer US $200,00. Enfim, um aborrecimento que não assume as dimensões da catástrofe profetizada cá entre nós.

a lei de bronze


Ricardo,

O que se passa actualmente em Portugal com a classe política dirigente, não é mais do que a confirmação da velha «lei de bronze da oligarquia», com que Robert Michels interpretava a evolução de um sistema partidário estabilizado. Numa palavra, a classe política dirigente acaba por ser maioritariamente constituída, ao fim de algum tempo da duração de um regime, por gente que subtilmente vai tomando o controlo dos partidos, e que, uma vez no comando, se bloqueia e isola do resto do mundo, afastando os elementos de renovação. Tal afastamento repercute-se, também, em relação ao eleitorado que os elegeu, cuja necessidade só é sentida ciclicamente, em tempo de eleições. Para além de se tratar de uma manifestação óbvia do instinto de auto-preservação e de subsistência, esta oligarquização cumpre a finalidade de manter o poder e os benefícios pessoais que dele decorrem para aqueles que dominam as estruturas partidárias, por pequenas que elas sejam. O distanciamento em relação à realidade, mesmo até a insensibilização em relação aos problemas das pessoas ditas comuns, é um corolário lógico desse processo. É isso que se passa, neste momento, em Portugal, com os partidos políticos absolutamente divorciados da realidade da vida das pessoas, de tal modo que, quer estejam no poder quer estejam na oposição, dizem sempre o mesmo, fazem sempre o mesmo, prometem sempre o mesmo e, uma vez no governo, comportam-se sempre da mesma maneira, como se nada tivessem a dizer aos cidadãos.

Em condições normais da nossa História, a de um pequeno país sem peso específico no mundo e isolado da civilização, emparedado entre o Atlântico e Castela, não duvido que a pressão já seria muito maior e o caldo certamente já teria entornado. Se reparares, com excepção do período da autocracia salazarista, nunca houve um ciclo temporalmente tão extenso de um mesmo regime, nos quase duzentos anos que leva o nosso Estado Constitucional. O período de maior estabilidade que tivemos foi provavelmente o da Regeneração, que findou com a revolta popular da Janeirinha, quando levava apenas dezassete anos de existência, provavelmente a única revolta que tivemos provocada pelos abusos tributários do nosso Estado.

Eu não tenho quaisquer dúvidas que, repito, nas nossas condições históricas habituais, a “tropa” já teria vindo para a rua há muito tempo, com a populaça atrás dela. Essa era, de resto, a nossa maneira tradicional de «renovar» a classe política e de quebrar a dita «lei de bronze», de modo a permitir, de tempos a tempos, a substituição de quem governava.

Só que este esquema tradicional, em Portugal e na generalidade dos países europeus, viu-se interrompido por um factor inédito: a integração comunitária e a sua resultante que é a actual União Europeia. Enquanto ela durar, sairá sempre muito mais barato aos alemães e aos franceses irem-nos alimentando a um custo que, para eles, não é insuportável, do que nos terem para aqui aos pontapés uns aos outros. Já viste, Ricardo, o péssimo aspecto que daria à Europa que se pretende civilizada, ter na sua periferia um país insignificante, onde frequentemente saíssem à rua generais de pingalim gasto e de monócolo riscado e sargentos com fardas mal lavadas a chefiarem “revoluções” de opereta, com tanques sem gasolina e soldados sem munições, e a fazerem proclamações patrióticas aos indígenas numa linguagem rocambolesca? Não é cenário que se queira ou sequer se anteveja em Bruxelas, onde, aliás, tem assento um dos mais insignes portugueses de todos os tempos, o invejável Presidente da Comissão Europeia, em muito boa hora para lá levado pelos seus colegas das chancelarias europeias.

Não, Ricardo. Enquanto a União durar, não teremos nem revolução, nem renovação da classe política, nem coisa muito distinta da que tivemos nas últimas décadas. E como ainda há muito para “governar” neste país, as coisas só poderão piorar, com a indiferença crescente e acentuada dos governantes em relação aos governados, para quem verdadeiramente somos cada vez menos importantes.

cartas nórdicas


Subscrito pela Sr.ª Erika Svøěnsen (na foto), secretária particular do Sr. José Camarinha, recebemos, via e-mail, a seguinte nota, que reproduzimos:

«O Comendador (Torre e Espada) José Camarinha tomou conhecimento do amável convite que lhe foi dirigido pelo V. blog, para escrever um post onde lhe fosse permitido refutar a tese do Prof. Pedro Arroja sobre o erotismo do povo sueco.

O Sr. Camarinha é um profundo conhecedor do povo e da alma nórdica, muito particularmente da sociologia e da antropologia suecas, a quem tem dedicado o melhor do seu esforço e trabalho nos últimos anos. É, também, um leitor assíduo e diário do Portugal Contemporâneo, blog que considera entre os primeiros nas suas leituras e reflexões quotidianas («very good for my english!», costuma dizer). Nada lhe daria, portanto, mais prazer do que responder afirmativamente ao vosso convite.

Todavia, as exigências do período balnear em que nos encontramos presentemente no Algarve, obrigam o Comendador Camarinha a concentrar-se exclusivamente no seu trabalho e no despacho permanente dos muitos assuntos pendentes que, por esta época do ano, sempre tem entre mãos. Declina, assim, a V. amável distinção, à qual pede escusa, de momento, embora agradecendo-a, sensibilizado.

Com os mais cordiais cumprimentos,

Erika Svøěnsen
Secretária Particular do Comendador José Camarinha (Época Primavera-Verão)

P.S.: O Comendador manda dizer que o gajo da fotografia que ilustrou o post do convite, não é ele, mas um reles imitador, a quem já prometeu tratamento apropriado, caso o energúmeno se atreva a aparecer pelo Reino dos Algarves.

12 agosto 2008

Não comprometidos


Rui,

Excelente post em resposta ao meu comentário que, confesso, talvez esteja um bocadinho exagerado.

Mas, apesar de tudo, mantenho a mensagem subjacente. Ou seja, que estes políticos não estão nada interessados em mudar o actual sistema que os privilegia a eles em prejuízo de todos os cidadãos que estão fora da política. O que faz com que a população os desdenhe, mas que os inveje em simultâneo. Porque é evidente que todos os que chegam a um certo nível na política portuguesa ficam a salvo da precariedade que, em termos gerais, caracteriza a vida da maioria dos portugueses. Em Portugal, entrar na política ou na função pública é a forma, mais ou menos certa, de evitar o drama que a generalidade dos cidadãos enfrenta: a armadilha da classe média, representada na figura de empregos meramente razoáveis, salários com reduzida margem de progressão e zero perspectivas de evolução. E a criminalidade que começa a generalizar-se em Portugal – o recente caso dos brasileiros no balcão do BES é um exemplo disso mesmo – dá conta de que a situação social se está a deteriorar de forma significativa.

Agora, é evidente que eu não desejo que o país entre em convulsão social, nem defendo nenhuma revolução. E quanto à nossa permanência na União Europeia, é um dado adquirido – pelo menos até 2013 – e ainda bem que assim é. O que me parece é que as condições começam a ser propícias à denúncia, com consequências práticas, dos conflitos de interesses que poluem as nossas instituições de Estado. Porque enquanto a conjuntura é favorável, a população vê alguma luz ao fundo de túnel e se calhar até se diverte com algumas histórias de favorecimento político. Mas quando começa a não existir dinheiro e o garrote da classe média se começa a fazer sentir, então, as pessoas mudam de opinião e de representantes. No estado em que as coisas estão os novos representantes terão de ser outros, não corrompidos pelo actual regime parlamentar, que possam cortar a eito. E, dada a dificuldade de os fiscalizar, também terão de ser em menor número. Daí que eu defenda a ideia de que, a prazo, poderão emergir da sociedade civil certos grupos de indivíduos, não comprometidos, que conduzam a democracia portuguesa para um regime de representação directa.

11 agosto 2008

em defesa das suecas

Tratando-se de um assunto polémico, convidámos, em homenagem ao princípio do contraditório, o senhor da foto, o famoso empresário algarvio José Camarinha (Zézé para os amigos), a pronunciar-se sobre o erotismo das suecas (dos suecos, fracamente, não nos interessa), tema em que é notoriamente especialista. Até agora, não nos foi dada qualquer resposta. Parece que o mês de Agosto é particularmente intenso para os profissionais do turismo algarvio, e que o nosso Zézé não tem mãos a medir. Aguardemos, então, por melhores dias.

09 agosto 2008

in a Swedish beach


Miss Pearls in a Swedish beach with her newest bikini. Under her arm a copy of Kant's The Critique of Pure Reason. Too bad the sun was missing that day. In the absence of the sun and of interesting people (*), what else to do other than reading Kant?
.
(*) The Swedish, both male and female, are utterly uninteresting and anti-erotic people.

She has arrived


Everybody seems to like Miss Pearls in the blogosphere. They send congratulations to her, they send kisses to her, they exchange good wishes with her, and so on. Just words, in the good Portuguese tradition. For the only blogonaut who seems to be in real physical contact with her at this time of the year is ... guess who? Me.

We met for two hours today. Physically, I mean. Talking. Just imagine, Miss Pearls loves Sweden. What a country that is, Sweden! Miss Pearls loving Sweden is as funny as zazie loving Kant. I fear next year she will spend her vacation in a Swedish beach. What beautiful beaches there are in Sweden (see above). I suggest she take with her The Critique of Pure Reason. Reading Kant in a Swedish beach is heaven.

The economics of bank robberies


At any given moment there is a fixed supply of banks to be robbed in any given the country. The demand for bank robberies depends on several different factors:

-The average level of income in the country. Other things being equal there will be more bank robberies in poor countries than in rich countries.

-The severity of criminal law. Countries with longer prison sentences for robbing a bank will have fewer bank robberies than countries with more lenient criminal legislation in this respect, ceteris paribus.

-The efficiency of the police force and of the judicial system. Countries with both a very efficient police force which with a high degree of probability promptly catches the thieves or kills them and a very efficient judicial system, which promptly puts them behind bars, tend to have fewer bank robberies than countries with both an inefficient police force and judicial system, other things being equal.

Consider now two countries, Portugal and Brazil. The market for bank robberies in Brazil is far larger than the market for bank robberies in Portugal, because of the larger size of Brazil and its lower level of income. Assuming the same number of bank branches per thousand population in both countries, the benefit of robbing a bank in Portugal is higher than in Brasil since, because of the higher level of income prevailing in Portugal, the Portuguese bank branch is expected to have more money in its vaults than its Brazilian counterpart.

The main cost of robbing a bank consists essentially of the probability of the thieves being caught and the harshness with which they will be treated by police and the justice system. In this respect the expected cost of robbing a bank seems to be far lower in Portugal than in Brazil, judging from the reputation of brutality that has been attached to the Brazilian police and the sub-human conditions that seem prevail in Brazilian prisons.

Since the rewards are higher, and the costs lower, of robbing a bank in Portugal as compared to Brazil, under conditions of free mouvement of people between the two countries, bank robbers tend to migrate from Brazil to Portugal.
.
There seems to be only two solutions to deal with this problem. First, Portugal becoming more selective in its immigration policy with regard to Brazil. Second, Portugal increasing the harshness with which its police and judicial systems deal with bank robbers. If neither of these solutions is adopted and if, instead, a liberal immigration policy is pursued soon we will have in the country a criminal scene with regard to bank robberies very much identical to that of Brazil.

duas sugestões sobre sequestros e violência policial